quinta-feira, 30 de julho de 2015

HUMANIDADE, LADEIRA ABAIXO...

Acordei, hoje, com uma triste e grave notícia. Um duro golpe contra a integridade moral da raça humana.
Um trem, deliberadamente, passou sobre o corpo de um homem, previamente atropelado por outra composição e que tinha ficado caído sobre uma das linhas, perto da estação de Madureira.
Não foi preciso assistir ao desumano ato, cortado (graças a Deus) pelos editores da TV Globo, para me chocar com o fato, pois só a imagem do fiscal da linha férrea ordenando que o maquinista seguisse por sobre o falecido já era suficientemente absurda.
Um exemplo da decrepitude do ser humano.


Não falo nem de aspectos práticos como o da determinação policial de que não se mexa num cadáver até que a perícia seja realizada; falo sobre a ausência total de sensibilização com aquela situação.
Se um saco de lixo estivesse obstruindo a linha, talvez os funcionários o tivessem retirado, mas não era. Se tratava "apenas" de um semelhante.
Sinceramente, não consigo nem conjecturar o que se passava na cabeça do fiscal e na do maquinista. Talvez tenham pensado apenas em evitar mais um atraso da sempre atrasada Supervia, e ponto final.
Mas ficam as perguntas no ar:
Como conseguiram se comportar de forma tão fria?
Como conseguiram dormir à noite?

Como diria uma amiga: "Convoquem o meteoro, porque o prazo de validade dos humanos já venceu"

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sexta-feira, 24 de julho de 2015

18 ANOS

Você se lembra de quando completou 18 anos de idade?
Provavelmente, sim...
Eu me lembro bem.
Naquela época (falo do início dos anos oitenta), acho que fazer 18 anos tinha mais significados do que hoje.
Lembro que no dia 17 de março de 1981 fiz duas coisas, até então, proibidas. Fui assistir a um filme impróprio para menores de 18 e pedi uma cerveja na pastelaria que tinha bem perto da minha casa. Não que eu não bebesse antes. Acho que o ano de 80 foi aquele no qual eu mais bebi. Não em quantidade, mas em dias “bebidos”. Foram muitas as noites regadas a chopp (um, dois, ou três, de acordo com a disponibilidade monetária) junto com amigos de colégio. Barril 1800 e Jangadeiro, em Ipanema, eram os preferidos da turma. Mas a dona da pastelaria, que me conhecia há muitos anos, não deixava que me servissem bebida alcoólica, como rezava a lei. Por isso mesmo, no dia em que a nova idade chegou, fiz questão de pedir uma minissaia da Brahma (Alguém hoje ainda lembra delas? Era um tipo de avó da long-neck, só que rechonchuda).



Outro fator também marcou meus 18 anos. Tinha acabado de entrar na Faculdade e nem podia imaginar o quanto minha vida mudaria dali pra frente. Mudanças para melhor, graças a Deus.
Conheci grandes amigos, descobri novos horizontes, novas possibilidades, ou seja, cresci.



Pois bem, no sábado, dia 26 de julho de 2015, é minha filha, Clara, quem faz 18 anos. E eu me pego aqui escrevendo essas linhas, numa tentativa de encarar tal fato.
Não vejam neste texto qualquer resquício de saudosismo ou de lamúrias do tipo “ainda noutro dia ela era um bebê”. Muito pelo contrário. O texto é uma celebração. A celebração de uma passagem que, apesar de ser uma mera convenção de nossa sociedade, tem seu simbolismo.
O horizonte aberto que se apresentava a mim, mais de três décadas atrás, agora se descortina para ela e isso é um bocado inspirador.
Afinal, tão importante como os primeiros passos, as primeiras palavras, os quais acompanhei com encantamento, são os outros passos que se seguirão, as outras palavras que virão.
E chego a este momento com um enorme sentimento de confiança, pois vejo que minha filha se uma pessoa inteligente, sensível, consciente, companheira... Um ser do bem.
Um amor que a vida me deu de presente
Eu, como pai, estarei sempre por perto, não para interferir, mas para apoiar quando necessário for.
E sempre na torcida para que os caminhos que serão trilhados daqui pra frente sejam os melhores que se possa desejar.

terça-feira, 21 de julho de 2015

SE NÃO VOU ATRÁS DO LIVRO...

Já tinha me acontecido uma vez. Há muitos anos, no século passado... Estava hospedado em um hotel perto da estação Santa Lucia, em Veneza. (Abro parenteses para não deixar de dizer que a paisagem do Grande Canal quando se desembarca em Veneza, pela primeira vez, é algo de indescritível e, por isso mesmo, não vou tentar descrever aqui. Só aconselho àqueles que pretendem conhecer a cidade a chegarem de trem e não de avião).
Mas voltando à história que eu estava contando, num determinado dia, dando umas voltas pelos arredores, dei de cara com um livro com as mais famosas obras de Salvador Dalí.



Tinha, nessa mesma viagem, visto uma mostra do ensandecido artista espanhol em Zurique e virara fã de vez.


A tentação de levar para casa as reproduções dos quadros que havia visto era grande. O preço não era alto (na época ainda em Liras, pois não havia o Euro). Porém, mais pão-duro do que duro, abdiquei da compra.
É lógico que mal deixei Veneza, o peso na consciência me abalroou.
Pensava em como havia sido estúpido por deixar aquela oportunidade passar. Mas, nada mais podia fazer. Página virada...
Dois anos depois, já ao lado de Fernanda, minha mulher, com quem ainda namorava, fui novamente à Europa e, novamente, a Veneza. Desta vez nosso hotel ficava mais pros lados da ponte de Rialto. No entanto, numa caminhada por aquelas vielas e pontes, fomos parar perto da estação e a lembrança do livro foi inevitável. Resolvi ir até a livraria e, para minha surpresa, lá estava ele, ou, pelo menos, outro igualzinho.
Não tinha como não comprá-lo, mesmo viajando de mochilão. Minhas costas que reclamassem depois. Não deixaria passar aquela oportunidade pela segunda vez.
Relembro este caso porque, recentemente, me aconteceu algo parecido.
No início de 2014, estava eu perambulando pela Oxford Street, em Londres, fazendo hora, enquanto minha mulher, minha filha e minha mãe se aventuravam na Primark (loja barateira de lá) pela enésima vez. Eis que me surge uma livraria, programa, aliás, sempre muito bem-vindo.
No subsolo me deparei com aquelas tentadoras bancas de saldos e, numa delas, com um livro que reunia os trabalhos do grafiteiro Bansky, pseudônimo do britânico Robert Banks. Grafites que misturam humor negro e crítica social e que muito me agradam. Preço: 10 Libras Esterlinas (uns 35 reais, na época).




No entanto, como já estava ali há algum tempo, resolvi encontrar a mulherada na loja (pois não estávamos com celular) e depois voltar ao local para arrematar o livro.
Só que ao sairmos da Primark, começou a cair um toró e na ânsia de pegarmos um ônibus para nos abrigar, acabei esquecendo da livraria, de Bansky e do livro.
Vivi uma sensação de déjà vu, bem parecida com aquela do Dalí de Veneza, pois aquele era um dos últimos dias da viagem e não tive oportunidade de voltar à livraria.
Contudo, no mês passado, recebi um e-mail com o anúncio de uma liquidação da Livraria Cultura e ao clicar no link, qual livro encontro em meio a tantos outros oferecidos? O Bansky, em sua edição em português, e por míseros 20 reais.
Comprei-o.
O mais legal é que dessa vez não precisei correr atrás do livro; ele é que encontrou um forma tortuosa de chegar até mim.
Bansky já está lá em casa, bem perto de onde se encontra Dalí.
Boa companhia nunca é demais.

sexta-feira, 17 de julho de 2015

CURTINDO UM SOM

Costumo dizer que sou movido a música. Estou sempre ouvindo, cantarolando, assoviando. Isso me faz um apreciador de boa música (pelo menos para o meu gosto) e também um consumidor ávido.
O conceito de consumo, no entanto, em tempos digitais, mudou um bocado.


Já tive muitos vinis; muitos mesmo. Para adequar gosto tão custoso ao meu pífio orçamento, apelava para os sebos de discos. Uma garimpagem que me fez conhecer muita coisa boa e outras nem tanto, é claro. Mas pelo preço de um disco novo era possível comprar uma dúzia de usados. Uma oportunidade sem par para alguém que, como eu, aprendeu desde cedo a ser “chepeiro” e bom negociador com minha mãe, Dona Irene.
Com o acúmulo de vinis, um problema surgiu: a falta de espaço.
Quando fui morar em um conjugado, já casado, o problema se agravou e comecei a buscar alternativas. Investi numa sedutora tecnologia da Sony, o MiniDisc, um tipo de CD regravável que vinha dentro de um envólucro plástico, mais ou menos como as XDs de vídeo de hoje em dia. Prometiam uma qualidade de som e uma durabilidade muito maiores do que as velhas fitas cassete. Investi na coisa, que não era barata, porém, ocupava muito menos espaço. Passei meus vinis para os disquinhos, com todo os seus estalos e chiados do meio analógico. 


Só que novas tecnologias surgiram e os MDs se tornaram carta fora do baralho. Os gravadores de CD começaram a ficar baratos. A portabilidade do CD também facilitava. Disc-mans e CD players em carros nos ajudavam a ter nossas músicas onde quer que estivéssemos.
Passei, então, a acumular os reluzentes CDs. Mas, apesar de menores, logo me trouxeram o mesmo problema das velhas “bolachas”: CDs demais para espaço de menos, mesmo num apartamento maior.
O MP3 veio para me salvar. Passei cerca de 80% de meus CDs para um pen-drive (com o indispensável back-up no PC) e os vendi a preço de banana em sebos. Com isso, tenho algumas milhares de músicas armazenadas num pequeno dispositivo. Uma discoteca que ocuparia estantes e mais estantes, além de ácaros em profusão.



Os CDs de que mais gosto, por questões musicais ou sentimentais continuam comigo, embora compre cada vez menos. Lembro que logo que abriu a FNAC, um dos meus programas favoritos era ficar horas por lá descobrindo coisas novas.
Hoje, sou adepto do compartilhamento através da grande rede. Abro minha discoteca e busco o que quero na dos outros. Alguns chamam isso de pirataria, eu chamo de cultura colaborativa.
No entanto toda esta praticidade roubou um pouco de um velho hábito, o qual retomei com recentes aquisições musicais. O costume de ouvir um mesmo disco, e só ele, várias e várias vezes, destinando maior tempo para cada faixa, reparando em arranjos, na poesia das letras.
Nos tempos do vinil, quando a oferta era menor e a grana curta, fazia muito isso. Sabia de cor a ordem das músicas, além de todas as letras. Não sei como alguns deles permaneceram inteiros depois de tantos giros na vitrola.
Três CDs recentes me fizeram relembrar esse prazeroso hábito: Saudações Egberto, de Délia Fischer (só com músicas de Egberto Gismonti); Corpo de Baile, de Mônica Salmaso (com composições de Guinga e Paulo César Pinheiro) e Carbono, do sempre muito bom Lenine.
Aconselho a experiência tripla.

Garantia de momentos de grande deleite auditivo.   

quinta-feira, 2 de julho de 2015

DIREITA VOLVER

Lutas de vale-tudo, apesar do nome, têm regras.
Até o Jogo do Bicho, que é contravenção, tem regra. Vale o escrito.
Só não há regras para o presidente da câmara (minúsculas propositais) que ignora as regras do Parlamento e usa livres interpretações de vírgulas, alíneas e parágrafos conforme seus interesses e da bancada mais conservadora dos últimos tempos.


Ontem no apagar das luzes ele recolocou em pauta uma questão já derrotada em plenário e conseguiu reverter o resultado do dia anterior. Já tinha feito isso em relação aos financiamentos privados de campanha.
Veja a declaração do próprio após a manobra:
"Eu duvido que alguém tenha condições de tecnicamente me contestar uma vírgula"
Capitaneados por um sujeito ávido por poder e com uma reputação mais manchada do que chão de oficina, esses pretensos representantes do povo vão amassando, tal qual um rolo compressor, os vestígios de democracia que ainda restam em nosso país.
Quer saber mais sobre os processos contra o presidente da câmara? Leia aqui:
Você pode até ser a favor da redução da maioridade penal, mas por favor, não aplauda este tipo de atitude do congresso. Hoje a decisão pode ser favorável a seus interesses, mas amanhã pode vir algo bem pior (e não estou sendo catastrofista).
Se a sociedade aceitar calada as manobras, corre o risco de ver nossa democracia ruir.


As raposas tomaram conta do galinheiro.
Será que vamos esperar que não haja mais um ovo sequer para começarmos a tomar alguma providência.

quarta-feira, 1 de julho de 2015

VENCEMOS! E AGORA????

A Câmara de Deputados rejeitou a PEC 171 que, entre outros pontos, determinava  a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos em casos de crimes graves. Não foram obtidos os 308 votos necessários para ratificar a decisão tomada por uma comissão de deputados.
Os grupos contra a redução, incluídos os milhares de jovens que foram a Brasília fazer pressão, comemoraram.
Eu comemorei.





Mas a questão continua em aberto.
Não é porque não se reduziu a maioridade penal que a briga acabou. Muito pelo contrário, ela está apenas começando, isso é, se quisermos realmente avançar nesse tema.
O lema "mais escolas, menos prisões" tem que ser muito mais do que uma pichação em um muro.
A sociedade não pode ver esta questão como uma queda de braço. 


Quem defende a redução quer mais segurança, como todos nós. E já que a legislação não será mudada, algo tem que ser feito, não é?
Acredito que todos os setores da sociedade deveriam se unir em busca de soluções. Aproveitar essa mobilização para que o tema não caia no esquecimento, pelo menos até que uma nova vítima venha levantar a poeira que paira sob e sobre este grande tapete chamado Brasil.

Abaixo, um trecho de uma postagem do deputado Jean Wyllys sobre essa questão:

"...Hoje devemos celebrar, mas amanhã temos que continuar trabalhando... A insegurança pública não vai ser reduzida magicamente, da noite para o dia, com leis penais e mais polícia. Esse tipo de "solução" é uma mentira. Não funciona em nenhum lugar do mundo. E é uma maneira desumana e egoísta de encarar o problema. A violência e a insegurança não vão ser reduzidas senão como consequência da redução da desigualdade, da ampliação da cidadania e da garantia de direitos e oportunidades de viver uma vida digna... Redução não é solução, mas há soluções. Há soluções que demandarão tempo, dinheiro e políticas de curto, médio e longo prazo. E se não quisermos que a demagogia punitiva e o pesadelo orwelliano se imponham no futuro, precisamos encarar o problema de fundo com soluções de fundo. Não apenas para vivermos mais segur@s, mas principalmente para vivermos numa sociedade mais justa."

O problema não é só de uma fatia da população que se sente ameaçada. É de toda a sociedade brasileira. Ou alguém acha que o envolvimento com o crime se dá por gosto? 
Ok, podem existir exceções, mas o fato é que a nossa realidade empurra centenas de jovens para esse caminho. 
E não me venham dizer que estou sendo paternalista... 
Estou sendo realista.
É fácil criticar refastelado numa confortável poltrona ou "decidir" os rumos da nação numa rodada de chopp com os amigos. Mas as soluções vão muito além disso, como lembram as palavras do escritor e humorista Gregório Duvivier:

"...Não adianta intervenção militar, não adianta blindar todos os carros, não adianta reduzir a maioridade penal (SPOILER: isso nunca adiantou em lugar nenhum do mundo). Sabe por que os milionários americanos doam tanto dinheiro? Não é por empatia pelos mais pobres. Tampouco tem a ver só com isenção fiscal. Doam porque sabem que, quanto mais gente rica no mundo, mais gente consumindo e menos gente esfaqueando por bens de consumo. Um pobre menos pobre rende mais dinheiro para você e mais tranquilidade nos passeios de bicicleta. A gente quer o seu (o nosso) bem. É melhor ser a elite de um país rico do que a de um país pobre."

Resumo da ópera: se não aproveitarmos o momento para realmente buscar soluções, nenhum dos lados(e são muitos)sairá vencedor, mesmo achando que venceu.